sábado, 19 de fevereiro de 2011

PARTE 4

...continuação
E finalmente chegou o tempo da grande tormenta. Era uma manhã como outra qualquer, os preparativos para a partida se concretizavam, porém eu sentia que havia algo de diferente no ar. E tal como os animais eu farejava o perigo. Lembro-me de que ainda hesitei em partir, dando sinais de fraqueza no motor, engasguei, falhei, como que para impedir a nossa partida. Por certo se tivesse insistido teríamos ficado no porto, mas eu já não tinha mais forças para lutar contra o inevitável. Como poderia eu, uma velha embarcação, impedir meu capitão de se lançar às águas e ser feliz novamente, logo eu que dedicara a minha existência à sua felicidade.

E tendo isto como certo partimos para aquela que, embora eu ainda não soubesse, seria a nossa última viagem juntos. Partimos como tantas outras vezes fizéramos. Apenas mais uma jornada e pronto, voltaríamos para o nosso porto seguro. Mas os planos para nós eram outros.

Pouco tempo após termos partido, notei meu capitão sério, como que preocupado em demasia com alguma coisa. Tentei demonstrar interesse rangendo os motores, mas ele não fez conta. Das outras vezes que usara desta artimanha sempre havia dado certo. Não desta vez.

Éramos agora como dois estranhos. Aonde havia ido parar toda aquela cumplicidade? Não mais nos comunicávamos com nossos olhares. Talvez porque não nos olhássemos mais porque meu capitão agora olhava em outra direção.

Seguimos navegando e pude notar algumas nuvens se aproximando, mas certamente meu capitão também as via. Notei, porém que não se desviava. E apenas quando era tarde demais foi que pude perceber sua intenção.

Uma tempestade se aproximava e ele não dava sinais de que se desviaria. Pelo contrário, senti que começou a exigir mais e mais de mim como se quisesse entrar naquele inferno mais rapidamente. E então eu tive a certeza. Era isto mesmo, ele não pretendia mais evitar as tempestades. Caímos, assim, dentro da pior das piores. Pensei desta vez é o fim, ou pelo menos, será o meu fim.

Só o meu? Não, claro que não. Todo mundo sabe que o capitão não abandona a sua embarcação. Antes, prefere afundar com ela.

É verdade, mas com este capitão foi diferente. A chuva fustigava o seu rosto. Não havia muito que fazer, já que não se enxergava nada. Subíamos muito alto para depois despencar ao sabor dos vagalhões que pareciam brincar conosco. Foram tantas as pancadas em meus costados que a certa altura a dor cessou. Lembro-me de ter pensado: - Deve ser o fim!

Por quanto tempo mais poderíamos suportar tamanha fúria? O tempo passava e parecia que não saíamos do lugar. Era como se tivéssemos entrado em um redemoinho e, assim, olhávamos em todas as direções ao mesmo tempo sem ver saída.
                                                                                                              continua...

Nenhum comentário:

Postar um comentário