sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

PARTE 3

...continuação
Ao retornar, a decepção; agora a sua embarcação lhe parecia ainda mais envelhecida. Decididamente ele não a queria mais. Precisava dar um jeito de se livrar dela.

E certo dia, falava ele com alguém a cerca da tal embarcação e eu quase não podia acreditar. Neste momento notei que comecei a fazer água por todos os lados. Desespero, de onde estaria vindo tanta água de uma só vez e tão de repente. Eu sabia estar precisando de reparos, mas também tinha consciência de que não eram tantos assim.

Quando meu capitão se deu conta do que estava acontecendo entrou em desespero, pois achou que sua velha embarcação não agüentaria o tranco daquela vez. Esta parecia ser a pior das tempestades que atravessavam juntos. E a pior das ironias é que sequer estava chovendo.

Passaram-se alguns meses até que as fissuras fossem todas consertadas ou, pelo menos, assim pareciam. Meses estes em que não pudemos sair do porto, não só pelas fissuras, mas também pelo medo que meu capitão estava de se arriscar em águas tranqüilas, porém desconhecidas.

Dizem que o tempo tudo cura, mas acho que isto não se aplica a nós, embarcações, no nosso caso o tempo apenas denuncia a nossa precariedade, deixando à mostra toda nossa vulnerabilidade. E isto meu capitão não suportava ver, pois apenas evidenciava a sua própria vulnerabilidade. E isto o seu orgulho não admitia, envelhecer não era com ele. Muito ainda havia para ser aproveitado e podia adivinhá-lo se perguntando como não havia percebido o tempo passar. Como era possível que estivesse com aquela idade e nada tivesse vivido ainda.

Era como se de repente tivesse acordado e pudesse sentir a vida pulsar dentro dele pela primeira vez. Tentou fugir, tentou ficar, mas ficou mesmo foi no meio do caminho. Nunca mais foi o mesmo, meu capitão. Era possível vê-lo tentando para depois desabar novamente.

Parecia agora que pouco tínhamos em comum, não que não tivéssemos mais os nossos bons momentos. Pelo contrário, nós os tínhamos e eram muito bons, mas eram apenas isto; momentos e já não eram mais suficientes. Ficava sempre aquele gosto de querer mais. Mais do quê? Apenas meu capitão sabia a resposta.

Sentia agora estar perdendo meu Norte, meu Sul, meu Leste e Oeste. Falhava-me a tão preciosa bússola em meio àquela imensidão azul. Desaparecia a certeza do amanhã. Tentei remendar o casco com os retalhos esgarçados de um passado distante. Dos ideais sobraram farrapos, dos sonhos, pedaços, da longa jornada, cansaço.

No ancoradouro tento trazer o horizonte para mais perto. Não preciso encontrar saída, pois a porta já se abriu. Sequer mais solucionar mistérios, pois estes já estão solucionados. Basta-me agora viajar, mas sem perder a alma.


Desta vez mergulho no oceano da minha alma, Perco-me em minhas águas mais profundas. Navego em mim mesma e me desfaço em ondas que vem e vão.  A verdadeira esperança é a certeza de que todo mal pode ser vencido e isto é a âncora da alma. Âncora que sustenta a vida e dá paz e segurança na tormenta.
                                                                                                                         continua...

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